quinta-feira, 30 de maio de 2013

O dia em que minha aldeia foi bombardeada


Eu sempre tive uma relação de medo diante do rio Preto. A aparente tranquilidade das águas turvas, a delicadeza dos ruídos das águas lambendo as margens nunca me esconderam inimagináveis ameaças forjadas na infância, habitantes das profundezas do velho rio.

A periodicidade de sua enchente e a frequência de afogamentos assombrava-me. Hermínio, o casal de namorados – tantos foram os meus amigos que desapareceram na aparente candura daquelas águas. Em minha família o medo do rio é constante: cresci vendo meu avô debulhando o Rosário na esperança que Nossa Senhora intercedesse no movimento das águas invadindo seu quintal, ameaçando sua casa e sua família.

Rua Sebastião Clementino ou rua de baixo


 

Certos homens nascem, crescem e morrem sem deixar nenhum sinal de sua passagem na Terra. Outros funcionam como um baú onde se acumulam lembranças, onde se guardam desejos, se concentram as mais variadas possibilidades. Estes são fundamentais. Eles concentram as essências de vida. Ajudam a firmar a identidade e as realizações de um povo - do seu povo.

Tornam-se monumentos, viram nomes de rua, prédios e gozam até a eternidade da simpatia popular. Já disseram que é uma maneira delicada de se esconjurar o esquecimento depois da morte e evitar o desaparecimento na noite dos tempos. Assim tratamos nossos ídolos- heróis ou mártires.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Maria Eugênia ou diálogo com meus mortos.


- Joga pedra, Chico!
-Cuidado. Olha o porrete na mão dela!
- Certin, certin! Corre molecada!
 -Meninada tem medo? Precisa ter medo, não. Certin, certin!

 
Maria Eugênia era Professora, Formada, Nomeada...  Certificado com letras maiúsculas, em escrita gótica. Assim se diplomavam as meninas da Escola Normal.
Maria Eugênia era um diamante negro. Certin, certin! Brilhava, assim como seu diploma gótico, afixado no casebre de sapé lá no alto da ladeira do Cavaco.