Certos homens nascem, crescem e morrem sem deixar nenhum
sinal de sua passagem na Terra. Outros funcionam como um baú onde se acumulam
lembranças, onde se guardam desejos, se concentram as mais variadas possibilidades.
Estes são fundamentais. Eles concentram as essências de vida. Ajudam a firmar a
identidade e as realizações de um povo - do seu povo.
Tornam-se monumentos, viram nomes de rua, prédios e gozam até
a eternidade da simpatia popular. Já disseram que é uma maneira delicada de se esconjurar
o esquecimento depois da morte e evitar o desaparecimento na noite dos tempos.
Assim tratamos nossos ídolos- heróis ou mártires.
Assim julgamos o nosso Sebastião Clementino. E quem seria este que há mais de meio século empresta seu nome a rua de baixo, lá na beira do rio que passa em minha aldeia? Penso que além dos moradores dali só os moços do correio sabem que a rua de baixo chama-se Rua Sebastião Clementino.
Assim julgamos o nosso Sebastião Clementino. E quem seria este que há mais de meio século empresta seu nome a rua de baixo, lá na beira do rio que passa em minha aldeia? Penso que além dos moradores dali só os moços do correio sabem que a rua de baixo chama-se Rua Sebastião Clementino.
O nome sugere um velho. Se está lá há mais de meio século, o
que teria ele feito para merecer tanta cortesia, tanta honraria dos
representantes do povo na Câmara de Vereadores?
Imagino um jovem hoje, morador do bairro Qualquer, que ao
passar nas proximidades da Igreja do Rosário depara com a placa com este nome –
Rua Sebastião Clementino. Seria um
político antigo? - questiona em segredo. Poderia ser um cantor sertanejo -
porque não? Um gênio da medicina, por acaso nascido ali – inteligência não pede
licença para nascer.
Pouca gente sabe que o nosso herói – o Sebastião Clementino
teve uma infância divertida lá pelos lados do Funil ou do São Cristóvão, não
sei. Imagino que o menino, o Tiãozinho-para os amigos, gostava de apanhar
goiaba no pé, de tomar banho de rio, de jogar futebol; Suponho um Tiãozinho
preocupado com questões religiosas nas vésperas do Natal ou da Semana Santa. Trabalhador
dedicado, já tirava leite das vacas como seu pai e seu avô.
Será que o jovem Sebastião Clementino teve alguma namorada?
Que sonhos teria sonhado o nosso herói? Quem eram os seus amigos prediletos?
Antes que outras perguntas se sucedam, quero falar com estes
moços que agora estão lendo este artigo. Sebastião Clementino pode ser um de
nós. Um de nós que mesmo nascido no fundo do vale, sonha ou sonhou superar as
barreiras dos morros e ganhar a vida pelo mundão dos homens. Sebastião
Clementino tem seu nome na rua, porque não teve nem tempo de ficar velho. Como?
Morreu antes. Tal como os jovens de 18 anos tinha desejos, sonhos e muita
energia. Trocou a rotina do sítio no Funil, quem sabe? – por uma guerra que nem
era dele, na Itália. Será que Tiãozinho imaginava os horrores de uma guerra na
Europa? Será que o Tiãozinho conhecia o significado de um ser patriota como as
vezes o denominavam? Que professora ensinou Tiãozinho...?
Ele pode ser um de nós. Que não tem tempo de ter futuro. E os
jovens hoje, por acaso imaginam algum futuro? Não deixemos que ele fique
esquecido. Afinal, seu nome tem um significado para os moços modernos. Sua vida
tão curta tem um sentido simbólico porque é de uma atualidade indiscutível.
E ele era só um menino, quem sabe, do Funil? Está
imortalizado naquela placa da Rua Sebastião Clementino, a rua de baixo na minha
aldeia. Mereceu um lugar no Monumento aos Pracinhas do Aterro do Flamengo no
Rio de Janeiro. Não o deixemos esquecido por lá. Nada de deixa-lo em paz. Ele é
símbolo. Sebastião Clementino permanece como muitos dos nossos moços sem razões
para ser feliz, um jovem sem futuro. Pensemos nisso. Assim nosso herói - mártir
ou ídolo, revivifica.
Maria Inês Portugal
agosto de 2012
Memória, Inês...é isso, não nos deixem esquecer...
ResponderExcluirMuito bom.
ResponderExcluirDeliciosa crônica. Texto memorial? Ficção histórica??
Tua prosa tem poesia e tudo isso.
Adorei.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSelma Monteiro Pereira11 de novembro de 2018 03:58
ResponderExcluirMaria Inês,amei esta crônica que, de uma forma poética e crítica,nos revela o nome de uma rua, de minha cidade,Rio Preto e, acima de tudo nos fala, dentro deste contexto,sobre a vida de um jovem que" pode ser um de nós. Que não tem tempo de ter futuro. E os jovens hoje, por acaso imaginam algum futuro? Não deixemos que ele fique esquecido. Afinal, seu nome tem um significado para os moços modernos. Sua vida tão curta tem um sentido simbólico porque é de uma atualidade indiscutível." Obrigada por este texto que traz, para o hoje, a vida de alguém tão próximo e esquecido e, como você diz,"ebastião Clementino permanece como muitos dos nossos moços sem razões para ser feliz, um jovem sem futuro. Pensemos nisso. Assim nosso herói - mártir ou ídolo, revivifica.
Muito bom. Parabéns pelo texto e pela preservação histórica.
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